Wednesday, May 8, 2019

O PORTUGUÊS ENQUANTO ELEMENTO DA IDENTIDADE CULTURAL DO POVO TIMORENSE


O presente artigo tem como foco abordar a Língua Portuguesa enquanto elemento da identidade cultural do povo timorense. O tema que se trata aqui já foi debatido logo nos primeiros anos da independência de Timor-Leste, o qual surgiu com algumas perspetivas antagónicas que se consideram como desafios quanto à afirmação da língua de Camões como um dos elementos da identidade nacional e cultural do povo timorense. Começo, portanto, por citar algumas dessas perspetivas que foram apresentadas  pelo linguista australiano, Geoffrey Hull, num Congresso Nacional realizado em Díli, afirmando ele o seguinte: 

Todos os timorenses estavam unidos em relação à fundação do novo estado; divergiam, no entanto, quanto à questão da língua e da cultura. Neste momento, existem duas perspetivas antagónicas sobre a identidade cultural de Timor-Leste, e entre estas existe todo um leque de correntes e pontos de vista. Por um lado, os elementos da velha geração querem que o português seja a única língua oficial, e não prevêem qualquer tipo de estatuto oficial para o tétum ou para os outros vernáculos. No extremo oposto, estão os jovens que querem que apenas e só o tétum seja a língua oficial, manifestando-se deveras apreensivos em relação ao português.” – (Extraído da publicação TIMOR-LESTE: Identidade, Língua e Política Educacional – Texto original em tétum elaborado pelo Prof. Dr. Geoffrey Hull, Universidade de Western Sydney (Austrália), e pelo Prof. Dr. Benjamim de Araújo e Corte-Real, da Universidade Nacional Timor Lorosa’e (Timor-Leste). – Tradução para o português, Maria da Graça D’Orey).

Partindo da premissa destes desafios, tentarei apresentar as minhas perspetivas quanto à afirmação da identidade cultural e nacional do povo timorense para a qual o português constitui, sem dúvida, um elemento fulcral. E a base teórica que fundamenta a opinião do presente artigo assenta na perspetiva de Geoffrey Hull, linguista australiano que se dedica ao estudo das línguas em Timor.

Assim, e com base no antagonismo supracitado, permitam-me viajar ainda um pouco para trás e refletir alguns cenários decorridos nos primeiros anos do nosso curso de licenciatura em ensino da língua portuguesa, no Liceu Dr. Francisco Machado, UNTL. Já no fim do ano de 2018 tive conversas com os meus amigos, jovens do mesmo curso, defensores e potenciadores para presente e futuro da língua portuguesa em Timor-Leste, e  lembrámo-nos perfeitamente que, entre os anos de 2005 e 2008,  havia algumas discussões e opiniões divergentes entre alguns estudantes do Departamento de Língua Inglesa e do Departamento de Língua Portuguesa relativamente à questão do português como língua oficial e língua de identidade nacional e cultural. O ambiente não era assim tão amigável ao longo desses anos, havendo então falas e discussões provocativas nos corredores, sobretudo por parte de alguns jovens do Departamento de Inglês. Sabemos, pois, que foi no período em que ainda havia presença da UNTAET que o mercado de trabalho em língua inglesa era muito procurado. Então, o grupo que dominava mais o inglês não queria que o português se difundisse e competisse no mercado de trabalho. É o que consideramos como tentativas para impedir o futuro da língua portuguesa em Timor-Leste.

Mesmo assim, importa dizer que a sociedade está sempre em constante mutação. Por isso, a maneira de pensar e de agir depende também das circunstâncias em que se encontra e do tempo em que se vive, pois neste momento estamos já num contexto diferente em termos de “contra” e “a favor” da língua portuguesa. Conheço muitos jovens que na altura não gostaram do português mas agora estão fazendo esforços para aprendê-lo, pois o português é, sem dúvida, o veículo principal na elaboração e transmissão de conhecimentos.
O que eu quero dizer com tudo isto é, para afirmar que a língua portuguesa é um elemento principal da nossa identidade nacional e cultural, em primeiro e no fundo, temos de reconhecer e aceitar que essa língua é nossa, e não é uma língua estrangeira.

O professor associado da Universidade de São Paulo, Brasil, e pesquisador da história do idioma português, Manoel Mourivaldo Santiago Almeida, afirma que “A língua é o principal elemento da identidade cultural de um povo”. Pois, através da língua ou da linguagem é que se vê e se conhece o mundo. Então, o tema propriamente dito trata-se de como as pessoas nos identificam culturalmente por meio da língua ou das línguagens, marcas e heranças portuguesas implantadas nas nossas veias e no nosso quotidiano. 

O português é uma semente já cultivada neste pedaço da ilha há muitos anos e que, através do seu poder e prestígio, faz crescer o tétum e outros vernáculos do país.

E como é que essa língua pode evoluir em Timor-Leste, no presente e no futuro? Neste sentido, Hull (sd. pg. 36) salienta que  “como resultado da campanha de difusão da língua portuguesa durante a segunda metade do século XIX, o tétum e os outros vernáculos ficaram impregnados de expressões, vocábulos e estruturas sintáticas portuguesas”.

A abordagem sociolinguística não separa a tríplice língua, identidade e cultura. É um tema de abordagem muito ampla. O povo de um determinado país vive com a sua língua, cultura, crença, e outros valores prticados no seu dia a dia.

Do que falamos então quando mencionamos que a cultura do povo timorense é caracterizada pela língua portuguesa?

No ponto de vista antropológico-sociológico, a cultura é o conjunto de atitudes e padrões de comportamentos, linguagens, conhecimentos e saberes adquiridos, costumes, informações etc. que distinguem um indivíduo, um grupo social e um povo numa perspetiva evolutiva. Neste sentido, ao longo de muitos anos, a língua portuguesa tem vindo a assumir um papel crucial na civilização moderna do povo timorense e na evolução cultural.

No fundo, a questão da cultura possui um sentido mais amplo e abrangente. Por isso, é necessário decifrar e explorar esse conceito que pode nortear a nossa abordagem quanto à identidade cultural. Destacamos assim a cultura na dimensão política e administrativa, a cultura jurídica, cultura na dimensão de identificação pessoal, culinária, indumentária, música, etc.

Quanto à identidade, falamos das “características e circunstâncias que distinguem uma pessoa ou uma coisa e graças às quais é possível individualizá-la”, (In Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Instituto António Houaiss de Lexicografia Portugal, Tomo II, pg. 2029). Ou melhor dizer, como é que se identifica uma pessoa pelo seu nome, pela sua maneira de ser, de vestir, de falar (sotaque), de comer, etc. É a partir destas características que somos identificados internamente e externamente.

Sincronizando esses conceitos teóricos, a minha perspetiva central quanto à afirmação da identidade cultural do povo timorense assenta em dois processos fundamentais que a língua portuguesa pode caracterizar, nomeadamente, o processo de identificação interna (dentro do país) e o processo de identificação externa (fora do país – na região do sudeste asiático, e noutras regiões do mundo).  Neste sentido, o papel de todos os cidadãos em difundir a língua portuguesa é extremamente importante.
Relativamente ao processo de identificação interna, podemos atentar nos seguintes elementos, nomeadamente, os nomes próprios de origem portuguesa sobretudo os apelidos que diferem, de uma maneira geral, a naturalidade do indivíduo, como por exemplo, Araújo e Corte-Real é de Ainaro; Babo é de Ermera; Gusmão, Sousa e Bonaparte são de Manatuto/Laleia/Vemasse e Baucau; Ximenes também é de Baucau; Sarmento é de Soibada; Lobato e Nunes são de Liquiçá e Soibada; Oliveira, Soares, Moniz e Osório são de Laclúbar; Lobato é de Liquiça/Bazartete e Soibada; Guterres é de Viqueque, Carceres é de Lacló, Xavier é de Aileu e Turiscai, etc.

Quanto aos nomes próprios, por um lado e sem dúvida, a maioria dos timorenses tem o nome de origem portuguesa mas, por outro, podemos constatar que a Igreja Católica já não é exigente como era. O meu pai é catequista e lembro-me que dantes, quando havia um programa de baptismo, ele e os padres não aceitavam qualquer nome de origem indonésia ou qualquer abreviatura a não ser o de origem portuguesa, sobretudo os nomes dos santos.

Um malae português ou brasileiro, quando for aos mercados de Díli ou mesmo no interior do país ou passeando pelas ruas de Díli, pode ficar surpreendido com a quantidade de produtos com o nome em português, desde logo frutos (tangerinhas, ananas, abacate, maçã, etc.); legumes (mostarda, alface, repolho, tomate, cenoura, etc.), e outras especiarias.  

Já no processo de identificação externa, temos certas características que diferem principalmente a nossa existência na região da Ásia e do Pacífico, bem como em outras regiões do mundo. Essas características são civilizadas e modernizadas pela língua portuguesa. Destacamos: Músicas e danças folclóricas e poesias (Hino Nacional Pátria, Pátria, etc.), arquiteturas, ação cívica de intelectuais e figuras públicas, etc.

Por outro lado, nós nunca podemos esquecer o papel dos média (jornalistas) e dos escritores na produção e divulgação da nossa cultura e literatura. Num estudo feito por Vicente Paulino, sobre os média e a afirmação da identidade cultural timorense (2014. pg. 2) diz o seguinte:  “É justo que se diga que, de entre os jornais publicados em Timor, a Seara foi, de todos, o que mais contribuiu para a correcta representação da cultura e identidade do povo timorense. De facto, este periódico teve um especial papel na divulgação das “ideias, crenças, tradições, lendas que nos permitem ver a alma destes povos tão simples e tão complexa, tão diferente da nossa, mas, em última análise, a braços com as mesmas eternas aspirações humanas, em presença das mesmas interrogações perturbadoras, em luta com os mesmos imponderáveis inimigos” (Jornal da SEARA, Ano 1-nº.1, 1949:11), o que diz Benedick Anderson. E por outro lado, o mesmo estudo diz ainda o seguinte: “Poder-se-á dizer também que a construção da identidade nacional do povo timorense resultou do esforço conjugado do papel “reconstrutor” dos media, da acção cívica de intelectuais e figuras públicas e, sobretudo, dos movimentos sociais.” (PAULINO, id ibidem. pg. 2).

Para além dos média, importa referir ainda o papel crucial dos escritores, nacionais e internacionais, que, através das suas obras literárias, divulguem a nossa identidade cultural pelo mundo. Uma análise feita por José Luís Giovanoni Fornos (sd. pg. 6), à obra de Luís Cardoso, O Ano em que Pigafetta Completou a Circum-navegação, diz o seguinte: O presente ensaio examina o romance O ano em que Pigafetta completou a circum-navegação (2012), levando em consideração aspectos históricos e de identidade, assinalados a partir do Oriente asiático. A trama composta pelo escritor timorense Luís Cardoso reflete sobre tais elementos, apoiando-se na representação de um grupo de personagens que reproduz a dinâmica política e cultural do Timor Leste, ex-colônia portuguesa.”

A questão do presente e futuro da língua portuguesa em Timor-Leste está nas nossas mãos – nós os jovens e as crianças – e estou certo de que, com o trabalho duro que temos feito, e que continuaremos a fazer, e o devido apoio e investimento do nosso Estado aos jovens potenciadores e crianças em todo o país, o futuro da Língua Portuguesa será mais consolidado, difundido, evoluído e que trará mais a luz do conhecimento e sabedoria. Muito obrigado!

Por: Francisco de Araújo

NB: Este artigo já foi apresentado numa redonda, cujo tema, o português enquanto elemento da identidade cultural, no dia 18 de outubro de 2018. É uma conferência das III Jornadas Pedagógicas organizadas por um grupo de estudantes do Departamento de Língua Portuguesa da FEAH/UNTL, com a colaboração do Centro de Língua Portuguesa.  



Tuesday, May 7, 2019

HAFURAK MORIS HO ESPERANSA


Iha foho tutun ida

Iha foho tutun ida ha'u hateke ba sorin-sorin haree-hetan universu nia furak oioin. Kriatura tomak iha ida-idak nia fatin. Du'ut matak haburas foho oan sira no ailaran tuan hotu hela ho hakmatek hodi halibur manu-fuik sira. Manu sira hananu iha ida-idak nia knu'uk hodi haksolok natureza no hafanun rai nia klamar ho aten-brani hodi fó nafatin iis-moris ba kriatura tomak. Balada fuik sira moris ho hakmatek iha ida-idak nia fatin.

Ha'u-nia matan hateke ba ailaran haree anin malirin semo tuir ai leten, semo besik ha'u no huu ha'u-nia isin sai furak-malirin.

Ha'u nani tuir anin nia laloran no ha'u mout liután iha universu nia furak. Abu-abu mosu hosi ailaran oan sira no semo halibur malu hodi taka-metin foho boot sira. Kadalak oan sira sulin nonook, sulin ba nafatin fila wee-inan, wee-inan nani tuir fatuk nia leten, sulin hodi sai meer iha tasi.

Hateke ba sidade no foho sira haree uma ho koor oioin. Ema mós oioin de'it. Ema maihosi ne'ebé, iha-ne'ebé no atu bá ne'ebé? Tanbasá ema iha?

Nune'e, ha'u husu ba universu atu hatán. Maibé universu la dehan buat ida.

Universu husu de'it atu hafurak ita-nia moris ho fiar no domin ba Maromak; hafurak ita-nia moris ho fiar no domin ba natureza; hafurak ita-nia moris ho domin ba maun-alin sira; hafurak ita-nia moris ho domin ba malu; hafurak ita-nia moris ho matenek; hafurak ita-nia moris ho buat natoon ne'ebé ita iha; hafurak ita-nia moris ho hahalok haraik-an no simplés; hafurak ita-nia moris ho respeitu; hafurak ita-nia moris ho fiar-malu; hafurak ita-nia moris ho haka'as-an ba estuda no servisu; hafurak ita-nia moris ho onestidade no responsabilidade; hafurak ita-nia moris ho esperansa katak ohin ita hasoru dezafiu oioin maibé loron aban no loron foun sei to'o mai ho buat foun, oportunidade foun nakonu ho haksolok iha moris rohan-laek.

Haka'as-an luta nafatin ba futuru ne'ebé di'ak. Estuda no servisu maka'as nafatin.

Francisco de Araújo (Q2 &VS)

Wednesday, March 27, 2019

MITOLOJIA TIMOROAN


MITOLOJIA TIMOROAN - Manu kaku'uk sira hananu iha kalan

Iha kalan-foho be hakmatek tebes, manu-kakuuk sira hahú hananu iha ai-samtuku no ai-rú sira-nia leten, iha horikle’un uma ha’u-nian iha Tidin-Botir. Ha’u tuur hakmatek hela iha ha’u-nia kuartu hodi rona lian furak sira-ne’e. Hafoin ida-ne’e, liuhosi janela ha’u hafuhu kalan ne’ebé hakmatek tebes, no hodi rona anin ne’ebé murmura iha aitahan matak sira-nia leet. 

Ha’u-nia apá ho amá ho tan tiu Manuel sei ko’alia hela, hafoin tiha han-kalan nian, kona-ba moris furak ne’ebé sira hala’o iha horik-fatin tuan Dirik-Hu’an no Kakolo, iha rai Laclúbar. Sira tuur iha biti ida no tuur-hale’u ahi-oan ida-ne’ebé haroman nakukun kalan ne’ebá nian, tanba iha tempu ne’ebá seidauk iha eletrisidade. Rai-kutun no borboleta ki’ikoan sira semo hadulas ahi-oan no anin ne’ebé huu hosi didin ku’ak hamate derpente tiha ahi nia lakan-roman. Uma laran sai nakukun. Tiu Manuel hasai iskeiru hosi nia kohe-mama ki’ik no halakan fila-fali kandeeiru. Kalan ne’ebá malirin tebes. Ami falun-an ho kapoti mahar boot.

Kalan fahe-rua ona, mai ita bá toba. – Ha’u-nia klamar ko’alia nonook mai ha’u.

Hein uitoan lai, ha’u sei hakarak rona manu-kaku’uk nia hananu no apá ho amá be tiu Manuel sira ko’alia. – Ha’u hatán.

Manu-kaku’uk sira kontinua hananu ho lian maka’as liután.

Nune’e, tiu Manuel ho apá be amá muda fali asuntu no hahú ko’alia kona-ba manu-kaku’uk sira-nia hananu:
Imi rona ka lae? Manu kau’uk sira hananu fali ona.  Ha’u-nia amá dehan.

Loos, sira hananu tanba mai fó-hatene katak ema ruma hosi família ka aldeia ne'e besik atu mate. Mai ita haree to’ok karik iha loron sira oinmai sei iha notísia balu kona-ba ema ruma atu mate. – Ha’u-nia apá hatán.


Ita haree to’ok! Manu kakuuk sira fó-sai kona-ba ema mate tanba sira nu’udar sasin-lia ba buat ne’ebé ladi’ak. – Tiu Manuel dehan teni.


Nune’e, ha’u sai hosi ha’u-nia kuartu no hola-parte iha dada-lia ne’ebá, hodi dehan ba sira nune’e: - manu kakuuk sira la’ós nu’udar sasin-lia ba buat ne’ebé ladi’ak. Ba kultura barak iha mundu, manu kakuuk sira simboliza matenek. Sira la toba iha kalan, sira nu’udar vijilante no neon-moris, ho matan-fuan nakloke boot, sira koñese no deskobre realidade sira-ne’ebé subar-an iha kalan nakukun.

Ha’u-nia amá no tiu Manuel hatán, hodi dehan: - Oan, ó la hatene maibé horikedas tempu ita-nia beiala sira-nian, manu kakuuk sira-nia hananu sempre lori lia ne’ebé ladi’ak, hodi fó-sai kona-ba ema ruma atu mate. Ema hotu iha rejiaun ida-ne’e fiar buat ne’e.

Maibé ida-ne’e nu’udar fiar ne’ebé la iha fundamentu. – Ha’u hatán.


Kalan fahe rua ona, ha’u mós la dehan tan buat ida, ha’u tama ba ha’u-nia kuartu no sa’e kama toba, hodi konsidera katak povu ida-idak iha mundu ne’e moris ho ninia mitu, ninia superstisaun no istória tradisionál sira. Ho tempu ne’ebé muda-an bele muda mós povu ida ninia mentalidade ne’ebé fiar ba buat ne’ebé la iha fundamentu ne’ebé abut-metin ona iha tempu barak nia laran. 

Francisco de Araújo


*********************** Versão portuguesa ********************************




MITOLOGIA TIMORENSE - As corujas cantam à noite

Na calmaria da noite bucólica, nos aredores da minha casa em Tidin-Botir, as corujas começaram a executar as suas vozes em cima dos ai samtuku(variedade de acácia usada para dar sombra à planta do café, em Tétum) e dos ai rús (palavão preto). Eu estava quieto no meu quarto a ouvir esses sons agradáveis. Instantes depois, espreitei pela janela a tranquilidade da noite, ouvindo o sussuro do vento nas folhagens verdes.

O meu pai, a minha mãe e o tio Manuel ainda estavam a conversar, depois do jantar, acerca dos belos tempos que tinham vivido e passado nas antigas moradias de Dirik-Hu'an e Kakolo, em Laclúbar. Sentaram-se numa esteira e à roda de um candeeiro que iluminou a escuridão daquela noite, pois não havia a eletricidade. Os insetos e pequenas borboletas voaram então em volta do candeeiro e o vento que sopra das brechas apagou repentinamente a luz. A sala ficou escura. O tio Manuel tirou o isqueiro do seu pequeno surrão e acendeu de novo o candeeiro. A noite era muito fria. Estávamos todos cobridos com a manta cobertor.

Já é meia noite, vamos dormir. – Disse silenciosamente a minha alma.
Espera um bocadinho, quero ouvir ainda o canto das corujas e a conversa dos pais e do tio Manuel. – Respondi.

As corujas continuaram a executar intensamente as suas vozes.
O tio Manuel e os meus pais mudaram então do assunto e começaram a falar sobre o canto das corujas:

Estão a ouvir? As corujas voltam a cantar. – Disse a minha mãe.

Sim, elas cantam porque vêm anunciar a proximidade da morte de alguém da família ou da aldeia. Vamos ver se nos próximos dias vier alguma notícia acerca da morte de alguém – Respondeu o meu pai.

Vamos lá ver! As corujas anunciam a morte porque elas são agourentas. – Acrescentou o tio Manuel.

Foi assim, saí do meu quarto e entrei na conversa, disse-lhes então: – as corujas não são agourentas. Para muitas culturas no mundo, elas simbolizam a sabedoria. Elas não dormem à noite, vigilantes e atentas, com olhos arregalados, conhecem e descobrem as realidades ocultas da noite.

A minha mãe e o tio Manuel responderam, dizendo: – Filho, tu não sabes mas desde o tempo dos nossos antepassados, o canto das corujas sempre traz má notícia, anunciando a morte de alguém. Todas as pessoas nesta região acreditam nisso.

Mas isso é superstição. – Respondi.

Já era meia noite, nada mais repliquei, fui ao meu quarto e deitei-me na cama, considerando que cada povo no mundo vive com os seus mitos, suas superstições e lendas. Com o passar do tempo pode-se mudar a mentalidade supersticiosa de um povo que já se enraizou há muito tempo.

Muito obrigado pela leitura!

Francisco de Araújo




Wednesday, December 5, 2018

BUIMESAK NI YINAN TI MALAHO


Foto: imajen google
 Istória tradisionál (lenda) yisa akerek noro haha Idaté - klasifikadu 1º lugar (konkursu Ha'u nia Lian, Ha'u nia Rai - Fundasaun Alola

Nain lubuk yisa radiuk kabesi arbau luhan. He wo’ar, arbau sira hirosi bulik he sira bár ilét, rusi weir hatik nabenu he lehu matak tanti namo oras lebas. Biwakik, nain yisa nate’uk hori lehu lauk una sore wer, namo wo kamudak tan. Ni takuran raba he lehu matak nodi natarik una nalihun ha’e he arbau weir hatik yisa ni lalan. Lo’o ni ha’e, nasae oler lo lehu lauk nodi nabua.

Biwakik hina, malaho yinan yisa mananeko wer be una ninu tanti maró biak. Ni kadolar maru-marun tina dudus los edi nain lei ni tarin, naha nahilas oler lo ni sarak he hatu koak.

Foto: imajen google
Nalau oi hula lu, malaho lei abuk tanti tarik ene ba ninu lei, naha nadari oi nanahuak mahinak yisa. He lelon ene nanahuak lei namori, malaho nobunobu má rawa’a ni. Ni yinan nadomi los ni. Nabali wo’ar, nabali lelon. Sira rua ramori kiak, ramori terus he hatu koak he lelon wa’ik ni lalan.

He oras lelon, malaho yinan lei tina sa’ut bulik la-á be rodi rá. Naha hina bein noro la’etak ba’ek seri odi atais ni wanan anak lei. Lelon namuda waon una wo’ar, wo’ar namuda waon una lelon, nanahuak lei ka’olik didiu.

He lelon yisa, nalu’i naha ti ni amán ení:
     - Tanti sá bení aba diuk oi noro ó he la’lu nia?
     - Be u apaik noro u amák ba hemene?
     - Ó animál yisa, naha au nain yisa oi, tantisá?
     - Eta ni banodi au ma he la’lu nia?

Ni yinan nasei ha’e bulik naha nidá:

- Ai…! Ó sei lai ma! O lu’i noro midá la lu nia los, arabe ó bilika ma’és. Ó bilika manoin wa’ik. Ó amán ti au lahelok. Kamak warua ó ka’olik hali ohi tada lau tan. – Ni amán natán.

Mahinak anak lei nasero nodi kini’a oler he ni yinan ni wein nodi nalu’i oler deskulpa:

- Deskulpa inak! Au bi tada dar bení, ita u winak lahelok.

He lelon tuir ma, ni yinan nakaur naha ni maluk sira para odi sarani ni. Ranaran ni te Buimesak. Runa festa wo’ar ateman yisa. Rinu, rá, radansa, ratebe rata wo’ar atún.

Warila festa nobu oi, la-á laek naha be una rá. Yisa ni, ni yinan nusi mesa ha’e ni nodi tina sa’ut la’á he lelon ateman yisa he namo lalak. Buimesak takuran mesa ha’e bulikhe hatu-koak. He oras e’ni, ai ni hunan sira kaek yian los, manu ahui sira raluhur ti ma bulik rodi rá ai-hunan noro huan.

Foto: imajen google
Nanahuak ulosan yisa noro fisga he liman mana sa’ut manu-ahui be una natiru, kabesi meker Buimesak bara mór. Ni natiru loos kakoak yisa ma toun los he hatu-koak ene Buimesak ba takuran mesa ha’e. Ata Buimesak bana bua oi. Manu lei toun nuna ni taridu, ma’és namo nodi nanau meker. Nanahuak manek lei natama lo hatu-koak be una nahu’at naha kakoak-maten lei. Natama ti, ni taridu oi ti Buimesak. Sira rua ma’és oi ró. Kakoak-maten lalata hui ha’e. Sira rua huar tutu’un naha ti ro. Manek lei nakasek didiu Buimesak nodi nalu’i naha e’ni:

- Tanti sa bení ó ba diuk oi henia?
- Ó naran sá?
- Ó mesa he nia eh?
- Ó apain noro ó amán sira ba hemene?

Buimesak natán:

- Au Buimesak. Au mesa! Ú amák tina sa’ut ami lar á he namo.


Buimesak nalu’i oler:

- Tanti sa bení ó tama he la’lú nia, ó hori mene, naha ó naran sá?
- Au hori ú adak. Au naran Maumesak au má mesa. Au sa’ut manu yisa aba tiru be ba manahu ha'e he la’lú nia. – Manek lei natán.

- Oi… enlei! Hu’at ti naha mulau edi. – Mahinak lei natán.
- Tu’u yila ó amán nahilas? Be o apain nalau lo mene ? – Manek lei nalu’i nahati.
- Au bi tada dar! – Mahinak natán.
- Tanti sa be’ni ó lu’i ni? – Mahinak nalu’i oler.
- Hmm…! – Manek nuna hahan, bina tan dar.
- Mulau edi! – Buimesak naru’a.

Nanahuak manek lei bina tada hei te Buimesak ni amán hori malaho. Nidá didiu te nakasek los Buimesak.

- Buimesak, u kasek biak ó! U kasek kaben noro ó. Ó kamo’ok loos. Ó mesa ha’e, ó bilika diuk mesa henia. U kasek oro ó nara nia lo ú adak. – Manek nidá.

- Hmm… au wo u kasek hina ó. U kasek oro ó lau, arabe.... - Buimesak nidá.
- Arabe nusá? Loin saik ma! La sá ni bi yan? – Manek lei nalu’i.

Foto: imajen google
Buimesak nadada iis naboin naloin segredu kahida ti mori nik. Ni disidi sai hori hatu-koak lei odi lau lo manek lei ni adan. Ni amán bina tada dar. Manek lei noro ni lau lo ada, sira rua rala edi ro. Família hori manek nik rasimu ni yan los i runa festa durante lelon rua. Sira rua ramori kontenti los.

Wowo’ar Buimesak ni amán na tí berak he sira adar nodi ná batar he ada lalak. Manek lei bina tada dar te malaho lei Buimesak ni yinan. Bení lelon yisa near oi malaho lei. Lo’oni ha’e, warila sira ratí he namo, batar sirak la morik rataka mos oi.

Buimesak nasero los tanti ni kaben near oi ni yinan

- Tanti sa bení ó sero? – Ni kaben nalu’i.
- Ó bi tada dar e… malaho ene oba mear lei u winak e’ni. – Buimesak natán
- Aiihh…, tanti sa beni obi loin hina ti au durante ita rua hetan ro rata tamori amutuk? Deskulpa! Au bi tada dar. – Manek lei taridu nodi nalu’i deskulpa.

Lo’o ni ha’e, manek lei nalu’i deskulpa naha nasa’ut oler sabulu yisa odi baka oler malaho lei be odi ti a-oi.

Ahú hori e’ni, manek lei binear tan malaho de’ot. Ni respeitu sira leleo-lelon. Sira rua ramori edi he família yisa koñesidu los he sidade lei.

Autór: Francisco de Araújo
Istória tradisionál nia konta hori: Joaquim da Silva

************************************************************

Istória nia sai primeiru lugar he konkursu akerek istória tradisionál noro Haha Inak (Lian Materna) Idaté, Projetu "Ha'u nia Lian, Ha'u nia Rai", organiza hori Fundasaun Alola, servisu amutuk noro Ministériu Edukasaun be Prezidénsia Repúblika, RDTL, he tinan 2010. He oras eni Haha Inak nobu-nobu, inklui tetun noro Portugés, he Timor hetan oportunidade odi konkorre.

Foto simu prémiu 1º lugál hori Administradór Timor Telecom he Palásiu Prezidensiál Aitarak Laran, Díli, 6 Novembru 2010.










Sunday, November 19, 2017

ELEMENTOS DA INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS



(Problemática na Interpretação do disposto no n.º 1 do artigo 106.º da CRDTL)

Surge recentemente, nas redes sociais e nos jornais, a multiplicidade de interpretação (sobretudo a interpretação particular e doutrinal) quanto ao artigo 106.º, n.º 1 da CRDTL.
Esta multiplicidade de interpretação tem causado, ainda, a problemática na letra da lei, como por exemplo, “partido mais votado”, “ou”, “aliança de partidos” e “maioria parlamentar”.
A interpretação de um texto jurídico é diferente da interpretação de um texto poético ou literário. O texto jurídico-constitucional, ao interpretá-lo, deve ter baseado e respeitado nos seus métodos e princípios da interpretação.

Neste artigo, tentarei fazer algumas análises, na perspetiva linguística, em resposta à questão colocada pelos alguns intérpretes quanto ao artigo 106.º, n-º 1 da CRDTL.
Antes de mais, para o nosso melhor entendimento, faço enquadrar, ainda, alguns conceitos teóricos sobre a interpretação das normas jurídicas. Portanto, a interpretação de uma norma jurídica assenta, principalmente, nos dois elementos, nomedamente, o elemento gramatical e o elemento lógico. O elemento gramatical permite ao intérprete avaliar em sua atividade o texto da lei, analisando as palavras e seus significados, para assim, conseguir determinar o que a lei expressa. Quanto ao elemento lógico, por sua vez, destina-se a interpretar o texto da norma conforme o pensamento lógico e racional, no qual se analisa a coerência do texto da lei. A coerência, neste sentido, tem a ver com a ligação de um conjunto de ideias ou de fatos cujo resultado é lógico. Por sua vez, este elemento lógico subdivide-se em três partes, tais como, o elemento histórico (circunstâncias em que a norma foi elaborada); o elemento sistemático (inserção da norma no ordenamento jurídico) e o elemento racional ou teleológico (constitui a ratio legis, ou seja, a razão de ser da norma) – adaptado da aula: Metodologia Jurídica, Propedêutica do Direito II. 

Por outro lado, e quanto ao resultado, é importa referir também que a interpretação pode ser declarativa (quando o sentido ou “espírito” da lei, determinado pelos elementos lógicos, corresponde perfeitamente ao significado das suas palavras); extensiva (quando a razão de ser da norma impõe uma sua aplicação a casos não diretamente abrangidos pelo texto, ou seja, o legislador disse menos do que queria); restritiva (quando a razão de ser da norma impõe qu esta não seja aplicada a todos os casos abrangidos pelo texto); revogatória (quando o intérprete afasta a aplicação da norma jurídica por esta se afigurar inválida) e enunciativa (quando o intérprete retira do texto da norma um sentido nele apenas implícito, com base em argumentos lógicos como o argumento a contrário. – adaptado da aula Metodologia Jurídica, Propedêutica do Direito II. 

Relativamente à interpretação do disposto no n.º 1 do artigo 106.º da CRDTL, segue abaixo algumas análises, na perspetiva linguística, quanto ao elemento gramatical da interpretação feita pelos intérpretes.
Artigo 106.º, nº 1 dispõe que:
“O Primeiro-Ministro é indigitado pelo partido mais votado ou pela aliança de partidos com maioria parlamentar e nomeado pelo Presidente da República, ouvidos os partidos políticos representados no Parlamento Nacional.”
Neste preceito, alguns intérpretes (adiante designado por 1º intérprete) defendem, na sua tese, que o Primeiro-Ministro é:
“Indigitado pelo partido mais votado (por maioria simples ou absoluta)”; ou
“Indigitado pela aliança de partidos com maioria parlamentar”.
Os outros intérpretes (adiante designado por 2º intérprete), na sua antítese, defendem que o Primeiro-Ministro é:
““Indigitado pelo partido mais votado com maioria parlamentar”; ou
“Indigitado pela aliança de partidos com maioria parlamentar”.
O que causou a possibilidade nesta interpretação é a conjunção “ou” e a expressão “maioria parlamentar”.
O 1º intérprete defendeu muito bem que o “partido mais votado” não se associa à expressão “maioria parlamentar” e refere-se especificamente ao partido vencedor (mais votado com maioria simples ou absoluta, neste caso o partido FRETILIN), e este interprete está certo na posição de que esta indigitação e nomeação é constitucional.
Enquanto o 2º intérprete defendeu que o “partido mais votado” se associa à expressão “maioria parlamentar” que segundo ele pode se ler assim “o partido mais votado com maioria parlamentar” e “aliança de partidos com maioria parlamentar”, e este intérprete está na posição de que esta indigitação e nomeação do Primeiro-Ministro é inconstitucional.
Portanto, na perspetiva linguística, e conforme o meu entendimento, “o partido mais votado” não se associa ao “maioria parlamentar”, ficando separadamente da seguinte forma:
“Indigitado pelo partido mais votado (por maioria simples ou absoluta)”; ou
“Indigitado pela aliança de partidos com maioria parlamentar”.

Assim, de acordo com o princípio da prevalência da Constituição, dentre as várias possibilidades de interpretação, só deve escolher-se uma interpretação não contrária ao texto e programa de norma ou normas constitucionais. Por isso, no meu argumento interpretativo, defendo que o primeiro intérprete está certo - “Indigitado pelo partido mais votado (por maioria simples ou absoluta)”; ou
“Indigitado pela aliança de partidos com maioria parlamentar”.

Portanto o disposto do n.º 1 do artigo 106.º da CRDTL prevê, para além de criar e ser um Governo Maioritário, igual e implicitamente a formação de um Governo Minoritário, embora o partido mais votado não consiga uma maioria parlamentar e mesmo que haja risco para a estabilidade governativa. Então, o processo de negociação para a coligação tem como objetivo principal estabelecer a coligação com outros partidos, com assentos parlamentares, a fim de conseguir a maioria parlamentar e manter e assegurar a estabilidade governativa. Portanto, a conclusão que posso chegar, a indigitação e nomeação do Primeiro-Ministro é constitucional. 

Muito obrigado e continuação de um bom fim de semana!

Díli, 23/09/2017

Francisco De Araújo
Tradutor e Intérprete Jurídico
Estudante da Faculdade de Direito da UNTL